Durou 2h20. Ou sete Boeings e quatro pequenos aviões rasantes sobre o estádio, nove pessoas atendidas no posto médico do lado direito do palco, 69 guitarras usadas e 10 trocas de roupa. A primeira noite da turnê sul-americana de Madonna, no Estádio Monumental de Nuñez, em Buenos Aires, durou o bastante para que fosse estrelada como sua estrela. Frenético, vulcânico, aeróbico, contemplativo, resfolegante, o espetáculo, que carrega a Sticky & sweet tour nas costas do planeta e chega ao Brasil no dia 14 (no Maracanã), miserabiliza o que chamam de show por aí desde o fim da suntuosa Popmart Tour (1998), do U2.
Espere por aqui o que aconteceu por lá. Andarilhos cansados tentando chegar ao campo do River Plate, trânsito confuso, banheiros químicos insuficientes, som apenas OK. Mesmo de posse de todas essas informações inerentes a um megashow, 66 mil pessoas espargiram-se pelas arquibancadas, pela área vip e pelas diferentes divisões de pista em busca de um contato visual melhor do que a habitual formiguinha ao longe.
Até seu último pulo em cena, Madonna já movimentou para dentro de suas carnudas contas bancárias cerca de US$ 220 milhões. E tudo aponta para que mais e mais caminhões-fortes tomem o rumo de seu numerário. Tudo isso por um motivo muito simples: Madonna faz espetáculo sério – no sentido profissional. E vale cada jantar fora bacana cancelado. São 23 canções, das quais nove de Hard candy, seu mais recente trabalho. O resto do repertório passeia por parte de seus outros 14 discos.
É tudo tão conectado, as coreografias são tão concatenadas que por vezes se pensa ver uma máquina programada. Na última das introduções, em Hung up, percebe-se Madonna como um ser humano. Detrás de um bloco móvel, ela pode ser vista conversando com um bailarino e respirando fundo para executar seus próximos movimentos.
A Madonna que está prestes a encarar a paisagem destronada da Linha Vermelha para chegar ao Copacabana Palace não é só a cantora limitada que se apóia nas voacalistas de fundo e em sua própria voz pré-gravada. É também a malhada que corre para cumprir as milimétricas bases, a atualizada com loops e crossovers acústicos. E, desta feita, é uma guitarrista com groove de rock, quase thrash metal. Como em Hung up e Borderline. É enredada pela seda violonística de La Isla Bonita, acompanhada pelo Kolpakov Trio, ou pela máxima da eletrônica de beats alucinógenos, materializada em Music e Ray of light.
Confronta-se com imagens de Britney Spears, Obama, ditadores árabes e duetos virtuais como o de 4 minutes, com Justin Timberlake. Permite-se até arriscar, como, ao fim do espetáculo, escolher alguém da platéia para sugerir um hit antigo. Prensado na grade, o argentino Tomás foi o eleito. Pediu Like a virgin. Sobre base rítmica única, sem harmonia, agrada ao rapaz e à platéia. Parecia querer compensar a frustração do show cancelado no dia anterior. Preocupação que os brasileiros não devem ter. Madonna espera que seus fãs zerem os 12 mil ingressos ainda disponíveis nas bilheterias cariocas para o dia 15. Isso não vai durar muito.
Mario Marques